Pesquisa da Universidade de Oxford mostra que, em média,
hidrelétricas em todo o mundo estouram o orçamento e ficam 96% mais caras. No
Brasil, essa porcentagem é ainda maior: 101%
A usina hidrelétrica de Itaipu, em
Foz do Iguaçu, Brasil (Foto: Keiny Andrade/LatinContent/Getty Images)
Quando a usina hidrelétrica de Jirau, em Rondônia, foi
leiloada em 2008, o investimento previsto para a construção do projeto era de
R$ 9 bilhões. Pouco depois do leilão, a empresa vencedora da concessão, a
Energia Sustentável do Brasil, anunciou uma mudança no local do projeto que
faria com que a usina custasse menos e produzisse mais energia. Não foi o que
aconteceu. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, a usina está
custando quase o dobro do inicialmente previsto, R$ 17,4 bilhões, e conta com
atraso de mais de um ano. Jirau não está sozinha. Um estudo publicado nesta
segunda-feira (10) mostra que grandes usinas hidrelétricas estouram o orçamento
e atrasam em todo o mundo, o que faz os pesquisadores questionar: vale a pena,
do ponto de vista econômico, construir grandes barragens?
Para um dos autores do estudo, Bent Flyvbjerg, da
Universidade de Oxford, no Reino Unido, há fortes evidências de que as grandes
hidrelétricas não são economicamente sustentáveis. O estudo publicado na
revista científica Energy Policy analisou 245 megabarragens,
construídas em 65 países entre 1934 e 2007. Eles descobriram que 90% das usinas
ficaram mais caras do que o orçamento inicial. Em média, as usinas atrasam cerca
de dois anos e terminam custando 96% a mais. Separando apenas as hidrelétricas
brasileiras, o aumento de custo é ainda maior: 101%. "Se esse valor fosse
considerado no planejamento inicial, esses grande projetos seriam quase sempre
considerados inviáveis economicamente", diz Flyvbjerg.
Segundo o pesquisador, atrasos e aumento de custos em obras
de infraestrutura são comuns. Mas esses problemas são muito maiores em
hidrelétricas do que em outros projetos. Estradas, por exemplo, têm aumento
médio de cerca de 20%, e ferrovias, 30%. "Só há dois tipos de projetos que
estouram mais o orçamento do que grandes hidrelétricas: infraestutura de
tecnologia de informação e os Jogos Olímpicos."
Por que as hidelétricas terminam custando tão mais caro?
Segundo outro autor do estudo, o pesquisador Atif Ansar, também da Universidade
de Oxford, isso ocorre porque os valores dos projetos são subestimados durante
as etapas de planejamento e nos estudos de viabilidade. Ele identifica algumas
causas. Uma delas é a questão técnica. "As hidrelétricas exigem um tipo
muito específico de construção, e a geologia do local pode se tornar um
problema, aumentando os riscos". Em países em desenvolvimento, a
dependência de maquinário importado também costuma aumentar os custos.
Mas problemas técnicos apenas não explicam o problema. Entre
as causas, há também casos de distorção nos projetos iniciais, quando técnicos
deliberadamente apresentam custos melhores para conseguir a aprovação política
do projeto, e um componente psicológico: estudos de viabilidade tendem a
assumir posições otimistas. "Estudos em psicologia mostram que seres
humanos são naturalmente otimistas em relação a tempo e custo, seja no caso de
fazer compras no mercado ou planejar as férias, seja ao projetar grandes obras
de infraestrutura."
O ponto que mais impressiona no estudo da Oxford é que os
mesmos erros vêm se repetindo sempre. A pesquisa encontrou os mesmos problemas
de atrasos e valores subestimados que ocorriam nas décadas de 1930 ou 1940 em
obras dos anos 2000. "Não há evidência de que as estimativas tenham
melhorado durante o tempo. Não há aprendizado em relação aos erros do
passado", diz o estudo. Obras como a usina de Estreito, no Maranhão, que
custou sete vezes mais, ou a hidrelétrica de Itaipu, no Paraná, com aumento de
240% nos custos, não parecem servir de exemplo para evitar problemas nas obras
mais recentes, como Jirau ou Belo Monte.
Canteiro de obras da usina hidrelétrica de Belo Monte, no
rio Xingu, no Pará, em foto de 2012 (Foto: Mario Tama/Getty Images)
Maior projeto de energia atualmente no país, a usina de Belo
Monte, no Pará, chama a atenção dos pesquisadores pelos riscos envolvidos. Há a
possibilidade de a usina ser simplesmente cara demais para valer a pena. Belo
Monte tinha custo avaliado em R$ 19 bilhões. Quando foi leiloada, em 2010, a
empresa Norte Energia pediu financiamento de R$ 26 bilhões. A expectativa é de
que o projeto fique ainda mais caro, já que há condicionantes sociais e
ambientais impostas pelo Ibama.
Apesar dos resultados, os pesquisadores dizem que não são
contra a energia hidrelétrica. O estudo apresenta uma série de medidas que pode
ajudar na administração de projetos e evitar grande aumento de custos, com mais
monitoramento e transparência nas obras, e sugere alocar recursos para energia
em projetos menores e de construção mais rápida, como as Pequenas Centrais
Hidrelétricas (PCHs). Para os projetos em andamento, como Belo Monte e Jirau,
os pesquisadores não são tão otimistas. "Uma vez que o projeto já está em
andamento, a única coisa a fazer é tentar contratar os melhores administradores
do mundo para tentar minimizar o prejuízo", diz Flyvbjerg.
Fonte: epoca.globo.com