PESQUISADORES DA USP DESENVOLVEM TÉCNICA QUE PERMITE DOBRAR A FABRICAÇÃO DO PRODUTO SEM AUMENTAR A EMISSÃO DE CO2.
Cimento na construção civil |
Cientistas da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) prometem revolucionar o mercado mundial de cimento. Um grupo de pesquisadores da instituição criou uma versão verde do produto, que permite dobrar a sua fabricação, sem que seja necessária a construção de novos fornos — e, por consequência, sem que a indústria aumente a emissão de CO2, um dos principais vilões do efeito estufa. “Para chegar a esse resultado, mudamos a composição do material usado para fazer cimento”, diz o professor Vanderley John, um dos responsáveis pelo projeto. “E, ainda assim, conseguimos obter a mesma resistência do produto convencional.”
Na teoria, a alteração promovida pelos pesquisadores da USP foi simples. Hoje, a indústria de cimento utiliza materiais reativos (que desencadeiam reações químicas) no processo de fabricação. O resultado dessas reações é a emissão de CO2 na atmosfera. Os cientistas mudaram a base — a receita — do preparo do cimento. Eles passaram a usar cotas cada vez maiores de materiais não reativos (calcário moído) no processo de fabricação. Hoje, em média, 6% do material empregado pela indústria não é reativo. No Brasil, essa cota atinge, no máximo, 10%. A equipe da USP conseguiu ampliar esse percentual para 70%.
A pesquisa do cimento verde começou em 2001. O trabalho já rendeu dois prêmios internacionais para os integrantes do Laboratório de Microestrutura e Ecoeficiência de Materiais da USP: um na Suécia e outro na Índia (concedido pela maior empresa de cimento do mundo, a Holcim). O professor John observa que o produto pode ser utilizado em 90% das construções. “Só ficam de fora as obras que usam concreto especial”, afirma o cientista.
A eventual disseminação do novo material pode ter um impacto expressivo no meio ambiente. A indústria do cimento vive um impasse. Hoje, em termos globais, é responsável pela emissão de 5% do CO2. Estudos da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) indicam que a produção de cimento deve dobrar nos próximos 40 anos, puxada pelos países em desenvolvimento. Se o processo de produção não for alterado e a demanda aumentar nessas proporções, a taxa de emissão da indústria pode saltar para 20% do total mundial. “Isso significa que as grandes empresas do setor iriam emitir mais do que um país”, diz John. “Com a versão verde, encontra-se um atalho sustentável em termos ambientais.”
Hoje, as empresas têm poucas alternativas para solucionar o problema. Uma das rotas analisadas é a alteração do desenho das plantas fabris, para que passem a capturar o carbono emitido. Essa via, porém, exige aportes pesados, o que alteraria o custo de fabricação do produto. Estima-se que as indústrias do setor teriam de desembolsar entre US$ 500 bilhões a US$ 800 bilhões para montar essa nova infraestrutura e, ainda assim, apenas atenuariam a situação atual. A inovação da USP, em tese, abre uma nova perspectiva nesse campo. E para facilitar a adoção em larga escala do cimento verde a equipe da universidade paulista não patenteou o novo processo de produção. “O objetivo dos nossos trabalhos é contribuir para que as empresas encontrem soluções eficientes, com menor impacto ambiental, sem aumentar custos e sem deixar de lucrar”, afirma o professor John. A equipe de cientistas mantém contatos com várias empresas no Brasil para firmar parcerias para o desenvolvimento do cimento verde em escala industrial.
Fonte: ÉpocaNegócios .