As estruturas são os elementos que recebem e conduzem as cargas advindas
do uso e da existência de uma edificação até a sua fundação[1].
É natural, portanto, que o projetista (Engenheiros e Arquitetos) tenha que
lidar com a Análise Estrutural. De modo imperfeito, porém não incompleto, a
Análise Estrutural compreende todos os esforços que o projetista faz para
responder a três questões fundamentais:1) A que solicitações a estrutura estará
submetida durante a vida útil prevista para a edificação? 2) Quais efeitos
essas solicitações provocam na estrutura? 3) Como responderão os elementos
estruturais aos efeitos neles suscitados pelas solicitações previstas? Na árdua
tarefa de conduzir os estudantes pelos intricados caminhos que essas três
questões fundamentais, e as numerosas subquestões que delas derivam,
professores e livros didáticos têm quase sempre optado pela estratégia de
dividir para conquistar.
Os conteúdos programáticos das disciplinas e as ementas de textos
básicos de Análise Estrutural repartem os conceitos, os métodos, as fases, os processos
e os critérios do estudo das estruturas em numerosas unidades de conhecimento.
Essa estratégia sequencial e linear, extremamente difundida no fazer acadêmico,
é de toda incompatível, tanto em sequência lógica quanto cronológica, com o
fazer profissional[2]. É
natural que o projetista tenha que partir de uma visão global e completa, ainda
que rascunhada, dos objetivos, dos requisitos, das limitações e dos
intervenientes do projeto estrutural. Somente após o domínio qualitativo das
formas e dos esquemas globais, é que o projeto estrutural percorre os caminhos
da subdivisão em elementos e seus respectivos dimensionamentos (análise
quantitativa) e procedimentos construtivos.
Em flagrante desconexão com o processo natural do projeto estrutural,
estudantes de Arquitetura e Engenharia são treinados, exaustivamente, a lidar
com o conhecimento da Engenharia em pequenos blocos. A estratégia se baseia na
hipótese de em algum instante (e por sua própria conta) os futuros projetistas
conseguirão organizar (em sentido reverso) as informações adquiridas (pregressas
e fragmentadas) no entendimento global dos projetos estruturais.
A hipótese raramente se confirma na prática. A premissa em que ela se
apoia possui uma ordem exatamente inversa à ordem natural do processo de
projeto estrutural. O processo ensinado e aprendido é, portanto, artificial! Consequentemente,
e quase universalmente, o resultado é quase sempre que os recém-formados deixem
os bancos da faculdade e entrem nos postos de trabalho com a impressão de que
nadam sabem. Eles sabem! Só não sabem que sabem! O conteúdo programático ao
longo dos 5 anos das graduações em Engenharia e Arquitetura são tão extensos
que me fazem recordar a afirmação do grande engenheiro civil espanhol Eduardo
Torroja Miret: “Nas escolas há tanto que aprender que rara vez sobra tempo para
pensar”[3].
O que os neófitos não sabem é organizar, e em ordem inversa, as numerosas
pequenas peças do quebra-cabeça obtidas nos anos de estudo universitário para
visualizar e pensar os projetos estruturais de forma global para solução de
problemas profissionais práticos.
Esse processo de treinamento é altamente eficiente na capacitação dos
alunos para resolução de problemas de listas de exercícios e de questões de provas.
Problemas artificialmente criados para terem solução do tipo fechada e única. Questões
altamente específicas, claramente delimitadas e exaustivamente mastigadas pelos
professores e autores de livros didáticos. Contudo, tal metodologia costuma
produzir estudantes incapazes de analisar sistemas de problemas complexos.
Inábeis para identificar e para confrontar questões básicas versus questões
detalhadas. Inaptos para formular, de forma independente, uma estratégia
hierárquica e um plano adequado para lidar com os problemas de Engenharia
práticos. Problemas reais que não possuem solução única nem fechada.
A questão que se impõe: Apesar dessas limitações tão universalmente
observadas por que essa metodologia se mantém nos cursos universitários e nos
livros didáticos? É algo em que penso desde que me tornei professor. E ainda
não cheguei a uma resposta conclusiva. Tenho alguns palpites. O primeiro deles
é a tradição. Nossos professores nos ensinaram desse modo. Antes deles, os
professores dos nossos professores os ensinaram assim. Parece um argumento
prosaico. E ele o é! O grande escritor inglês G. K. Chesterton dizia que o negócio
dos progressistas é continuar cometendo erros e que o papel dos conservadores é
evitar que os erros sejam corrigidos[4].
Mudar demanda tempo e energia. A lei do menor esforço é uma grande força da
natureza!
Outra suspeita que partilho é que a estratégia linear de dividir para
conquistar é extremamente viável. Ela facilita, e consolida, as versões
tradicionais da organização dos currículos escolares, da aplicação de
avaliações de aprendizado e da estruturação dos conteúdos programáticos. A
exigência e o esforço intelectual para estruturar livros e cursos de graduação
na ordem natural do pensar e do fazer do projeto estrutural têm se mostrado uma
demanda alta demais para grande parte dos professores e dos autores.
Por fim uma sugestão que me ocorre é o esquecimento. Engenheiros e
arquitetos (que acumulam os papéis de autores e professores) que já aprenderam
a analisar um problema estrutural na ordem natural e não precisam mais juntar
pequeninas peças de quebra-cabeças, parecem esquecer, ao perpetuar o modelo
clássico de aprendizado e ensino, do constante desassossego que os acompanhava
nos bancos das salas de aula e das bibliotecas universitárias.
O caminho a ser percorrido para que o processo de ensino e aprendizado emule
mais o processo natural do projeto estrutural me parece longo e árduo. Porém,
possível, e mais ainda, indispensável. Algumas iniciativas pontuais e simples,
porém, trariam grandes benefícios. A mais importante, ao meu ver é prover mais
experiências com a prática do projeto. Metodologias de aprendizado baseadas em
projeto[5]
refletem naturalmente a complexidade, a incompletude de dados, as diferentes (e
muitas vezes conflitantes) demandas comumente existentes na solução de
problemas de Engenharia Estrutural[6].
O uso de situações de projeto no ensino da Engenharia Estrutural é, ao meu ver,
uma estratégia viável de reconsiderar e repensar o treinamento de futuros
engenheiros e arquitetos para que sejam capazes de dominar problemas
estruturais de forma global e completa.
[2] Lin, T. Y. e
Stotesbury, S. D. Structural Concepts and Systems for Architects and Engineers,
1981
[4] The Everlasting Man, 1925.
[6] Mills, J. E. e Treagust, D. F. Engineering education – is problem
based or project-based learning the answer? Journal of Engineering Education,
2003.